Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
A sina, o caminho, ou simplesmente uma história. Um caminho igual a tantos outros, ou, uma história de vida, semelhante a tantas outras vidas. Uma história vivida, ou apenas fruto da minha imaginação.
No céu , Maria podia ver mais uma estrela a brilhar…
Sentia o céu cada vez mais como parte de si…
É impressionante como nos sentimos à medida que vamos sentindo o tempo a passar por nós. À medida que vamos vivendo a vida, vamos sentindo toda a natureza, como algo que cada vez mais, vai fazendo também parte de nós…
Cada vez mais a vamos conhecendo melhor, a vamos sentindo como nossa…
Maria sentia isso ao olhar o céu… De dia podia sentir o calor do sol, admirá-lo e senti-lo com ela…
Há noite, podia olhar as estrelas a brilharem no manto negro da noite, e sentir a sua companhia…
Maria tinha perdido o bebé que tanto desejava, mas tinha-lo transformado numa das estrelas que todas as noites podia ver para si brilhando…
Era uma mulher como tantas outras. Tinha a profissão que quis ter, não era de se queixar da vida, e estando ela já na casa dos trinta e alguns, sentia o desejo que qualquer mulher sente. O de poder sentir o amor de ser mãe…
Tinha o coração grande, com algumas cicatrizes, mas nenhuma se comparava àquela com que tinha ficado… Podia até viver sem o amor de um amigo, de um homem, mas nunca de um filho…
Sim, Maria já o sentia como tal… Como um filho, uma semente ou um rebento de todo o amor que tem dentro do si… Reuniu nele todo o amor que tinha em si. Todas as forças, deu-lhe todo o seu sentimento, tudo de si…
Naquela altura, tudo parecia mais calmo, mais sereno… Toda aquela fase de tranquilidade explodiu em poucas semanas. Primeiro, com a noticia de gravidez de risco. Depois com a prenuncio do fim…
Maria não era mulher de parar.. Nunca foi.
E não se convenceu que tinha de parar… Agora sobejam-lhe as ideias de culpa… Mesmo quando os entendidos lhe dizem, que fez tudo certo… Que a natureza é soberana. Há sempre algo dentro dela que numa rajada forte e seca de vento lhe diz, podias ter feito mais… O sentimento de culpa mitigado com impotência e raiva é o sangue que lhe corria nas veias…
Num pulo de semanas se passou para a triste noticia… Mais uma vez perdera sangue, e desta vez, já não havia vida…
A ideia de ter o seu amor dentro de si a morrer, matava-a. Mas depois a noticia que o seu amor tinha morrido dentro de si, já a tinha morto…
O amor morreu, a sua dor espelhava-se no rosto e as lágrimas tinham-lhe partido para o céu…
O tempo passou, reencontrou as lágrimas. mas aquelas que lhe correm agora no rosto, são o cumprimento à estrela, que do ventre lhe fugiu para o céu …
CLR
Foi então que numa noite fria de solidão sentida, Maria pegou no diário, ajeitou a caneta e escreveu:
“Durante um, dois ou três meses (às vezes mais), devaneamos o futuro. Apegamo-nos ao ser que começa a ser gerado cá dentro.
Concedemos-lhe a personalidade que na realidade ele ainda não tem e constituímos sobre algo ainda tão embrionário o fardo de um sublime e devaneado futuro.
O mundo estancou. Tal como a minha mente.
Permaneci, tal como permaneço ali, naqueles momentos, naqueles instantes longos, a tentar arrancar um sentido daquilo tudo.
Porquê, porquê, Porquê?
São perguntas às quais sei que nunca encontrarei resposta.
Abalei sem o futuro nas mãos. Tal e qual como ainda me sinto…
Deixei-o escorregar-me das mãos.
No sangue que foi correndo, também eu fui perdendo um pouco da felicidade que tinha dentro de mim…
O sentimento de injustiça foi o primeiro a surgir.
Depois veio a negação. Inexistiam sintomas de que algo estava assim tão errado.
Não... Não podia ser tão mau....
Já estava tudo a correr bem....
Porquê tudo outra vez?
Ou porque não foi tudo como da ultima vez?
Um susto....
Não podia ser... Eles só podiam estar errados...
Procurei freneticamente em toda a internet, respostas...Letras, palavras, que me podessem iludir ....
Procurei ao mesmo tempo que na mente corriam as letras
P O R Q U Ê?
Procurei, procurei, procurei. Procurei, na esperança de encontrar relatos de diagnósticos falhados. Encontrei alguns, mas poucos.
Mas, no fundo eu sabia qual era verdade…
E agora, como estou?
Vivo, ou já perdi parte de mim e como estou, também morri?”
CLR
As estrelas iluminam a noite, o sol vai iluminando o dia, mas a vida nem sempre faz o sol sorrir e as estrelas brilhar…
A vida nem sempre corre como ambicionamos.
Às vezes os instantes de emancipada fortuna acabam por transformar-se em momentos de dor, em que pura e simplesmente não lhe inventamos o sentido.
A verdade é que a natureza sabe muitas vezes mais do que nós, e age para nos poupar de maior sofrimento no futuro.
A natureza é sábia….
Esta era a frase que Maria mais tinha nos ouvidos…
Ela gostava muito de escrever, mas naquela época nem conseguia falar, quanto mais escrever…
Só conseguia pensar em como a dor se tornou tão sua amiga nos últimos meses, nos últimos anos…
Nos seu olhar podia reconhecer-se o brilho do sofrimento.
No sorriso havia a transparência forçada de quem não consegue esconder a dor...
Pouco falava. No trabalho, em casa, com os amigos, até com os familiares mais chegados...
Tinha passado a ser um assunto tabú... Como se isso de alguma forma lhe pudesse amortecer o sofrimento...
CLR
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.